UM IMPORTANTE EFEITO da Renúncia é a desobrigação quanto ao pagamento do IMPOSTO CAUSA MORTIS, já que só paga esse imposto o herdeiro que recebe a herança. Ainda que desconhecendo o falecimento e mesmo o direito de receber herança, pode ser possível ao herdeiro algum tempo depois do óbito formalmente renunciar/repudiar à herança (vide regra do par. único do art. 1.804) e com isso, por não ser contemplado no inventário com quaisquer bens/direitos, deixar de pagar o imposto referido, porém, será possível ao herdeiro escolher entre determinados bens da herança para recebê-los e renunciar aos outros?
Inicialmente é preciso revisitar o que diz o Código Civil de 2002 a respeito do instituto da Renúncia. Segundo a regra do art. 1.806 a "renúncia" será sempre expressa (a contrário da "aceitação", cf. art. 1.805) e deve respeito à forma exigida em Lei:
"Art. 1.806. A renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial".
No bojo do Inventário Judicial ela pode ser manifestada por Termo nos Autos ou ainda por Escritura Pública. No bojo do Inventário EXTRAJUDICIAL será um ato notarial (Escritura Pública) podendo constar de Escritura prévia e separada da Escritura do Inventário Principal (e é nossa recomendação) ou ainda, constar no bojo da mesma Escritura de Inventário - e - como sempre - os Cartórios cobrarão por cada manifestação, ainda que tudo esteja encapsulado na mesma Escritura Pública.
Expressamente o Código Civil não admite renúncia em parte, sob condição ou a termo. Essa é a regra do art. 1.808 do atual Código Civil que espelha a regra da primeira parte do art. 1.583 do Código Civil anterior. Reza o atual CCB:
"Art. 1.808. Não se pode aceitar ou renunciar a herança em parte, sob condição ou a termo".
Sobre esse dipositivo comenta o ilustre professor LUIZ PAULO VIEIRA DE CARVALHO (Direito das Sucessões. 2019), renomado especialista no assunto:
"É inadmissível, como antes ressaltado, a renúncia condicional ou parcial, de vez que, repetimos, a herança é COISA INDIVISÍVEL até a partilha ou adjudicação. Isso porque a renúncia, além de solene, é reputada legalmente irretratável, incondicionada, inaprazível ou pura e incindível, conforme art. 1.808 do Código Civil. (...) Não se permite, ainda, a renúncia parcial da herança, pois o herdeiro é o CONTINUADOR da totalidade das relações patrimoniais transmissíveis do 'de cuius'. Constata-se, assim, não ser possível, por exemplo, o herdeiro renunciar às dívidas do falecido e aceitar os créditos deixados por ele, ou renunciar aos bens móveis e aceitar os bens imóveis".
O referido mestre destaca, com seu já reconhecido brilhantismo, uma importante distinção entre as "espécies" de renúncia: a "Renúncia própria ou abdicativa" (que é o que de fato se conhece como renúncia ou repúdio, na forma da Lei, quando o herdeiro se demite da qualidade de herdeiro, fazendo com que a transmissão tenha-se por não verificada, como indica o par. único do art. 1.804) e a chamada "Renúncia translativa" que na verdade traveste uma Cessão de Direitos Hereditários graciosa.
Importa assentar, portanto, que o ordenamento jurídico brasileiro, pelo menos até o momento (já que não se desconhece que o Código Civil está em vias de ser modificado, conforme anteprojeto que tramita no Senado) não admite renúncia parcial a autorizar, por exemplo, que o herdeiro receba apenas alguns dos bens da herança que lhe interessem, desprezando os demais. Não se desconhece que outras soluções podem ser viáveis se essa for a intenção, como por exemplo uma Cessão de Direitos Hereditários, como já comentamos em outras passagens. Tudo vai depender efetivamente das peculiaridades de cada caso e legislação aplicável. A consulta a um Advogado Especialista é fundamental também nesse tipo de caso.
POR FIM, importa anotar que a recente edição 243 do informativo "Jurisprudência em Teses" do STJ trouxe diversas teses elaboradas com base na jurisprudência do STJ acerca da renúncia dentre elas aquela que confirma que de fato não se admite "Renúncia em parte", lapidada do REsp 1.433.650/GO que reza:
"REsp 1.433.650/GO. J. em: 19/11/2019. RECURSO ESPECIAL. SUCESSÃO. RENÚNCIA À HERANÇA. ATO FORMAL E SOLENE. ESCRITURA PÚBLICA. ATO NÃO SUJEITO À CONDIÇÃO OU TERMO. EFEITO DA RENÚNCIA: RENUNCIANTES CONSIDERADOS COMO NÃO EXISTENTES. (...) 2. Ao contrário da informalidade do ato de aceitação da herança, a renúncia exige forma expressa, cuja solenidade deve constar de instrumento público ou por termos nos autos (art. 1807), ocorrendo a sucessão como se o renunciante nunca tivesse existido, acrescendo-se sua porção hereditária à dos outros herdeiros da mesma classe. 3. A renúncia e a aceitação à herança são atos jurídicos puros não sujeitos a elementos acidentais. Essa a regra estabelecida no caput do art. 1808 do Código Civil, segundo o qual não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes, sob condição (evento futuro incerto) ou termo (evento futuro e certo). 4. No caso dos autos, a renúncia operada pelos recorrentes realizou-se nos termos da legislação de regência, produzindo todos os seus efeitos: a) ocorreu após a abertura da sucessão, antes que os herdeiros aceitassem a herança, mesmo que presumidamente, nos termos do art. 1807, do CC/2002; b) observou-se a forma por escritura pública, c) por agentes capazes, havendo de se considerar que os efeitos advindos do ato se verificaram. 5. Nessa linha, perfeita a renúncia, considera-se como se nunca tivessem existido os renunciantes, não remanescendo nenhum direito sobre o bem objeto do negócio acusado de nulo, nem sobre bem algum do patrimônio. 6. Recurso especial não provido".