A existência de indisponibilidade de bens na matrícula prejudica o procedimento da Adjudicação Compulsória Extrajudicial?

.

INDISPONIBILIDADE DE BENS é só um dos muitos gravames sobre os quais os interessados poderão se deparar por ocasião do exame da matrícula imobiliária, principalmente quando procurarem regularizar seu imóvel. Como já comentamos em outras passagens, a existência desse tipo de gravame ainda que não represente óbice para a LAVRATURA, por exemplo de uma Escritura de Compra e Venda (como indica com clareza o §1º do art. 14 do Provimento CNJ 39/2014) por certo representará impossibilidade do seu REGISTRO. Mas e com relação à regularização eventualmente proposta através da Adjudicação Compulsória - tanto pela via judicial quanto pela via extrajudicial - a existência da indisponibilidade de bens gravada na matrícula poderá impedir formalização da transmissão do bem?

A análise cuidadosa do caso aqui também será crucial. A respeito das indisponibilidades ensinam KÜMPBEL e FERRARI (Tratado Notarial e Registral. 2020):

"A indisponibilidade de bens é uma determinação legal ou judicial que pode recair sobre um imóvel ou outros direitos de determinada pessoa, coibindo atos de disposição. Tal constrição é impeditiva da alienação ou oneração do imóvel ou de outros direitos, ficando reservado como garantia do cumprimento de uma obrigação ou pagamento de uma dívida. A ordem é justamente para IMPEDIR que o devedor desfaça do seu patrimônio em prejuízo direto aos seus credores. (...) As ordens judiciais e administrativas que determinem indisponibilidades de bens imóveis são AVERBADAS nas matrículas respectivas. (...) Trata-se de uma forma especial de inalienabilidade e impenhorabilidade, impedindo o acesso do título ao fólio real, ainda que o referido título seja ANTERIOR à decretação da indisponibilidade. Aplica-se, assim, o princípio do TEMPUS REGIT ACTUM".

É possível compreender assim a indisponibilidade como uma forma de impedir que o titular dilapide seu patrimônio em benefício próprio, prejudicando terceiros. Na via judicial é tranquila a possibilidade da adjudicação compulsória - aqui vista como o remédio judicial que tem por finalidade suprir manifestação de vontade do antigo proprietário que se comprometeu à venda de bem imóvel mas não efetivou a outorga da escritura definitiva - ainda que posteriores ordens de indisponibilidades de bens hoje gravem a matrícula, como reconhece a jurisprudência do E. TJDFT:

TJDFT. 0712264-38.2020.8.07.0001. J. em: 12/05/2021. (...). ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA DE IMÓVEL. INTRUMENTO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. QUITAÇÃO ANTERIOR À INDISPONIBILIDADE JUDICIAL. (...). SENTENÇA REFORMADA. 1. Apelação contra sentença que julgou improcedentes os pedidos. (...). 4. A indisponibilidade judicial dos bens da empresa em recuperação visa obstar que esta dilapide seu patrimônio em próprio benefício, para não prejudicar direitos de terceiros, não alcançando, contudo, imóveis derivados de promessas de compra e venda, entabuladas e quitadas anteriormente ao referido bloqueio judicial, por força do direito real à aquisição, disposto no artigo 1.417 do CC. Precedente do STJ. 5. No caso em apreço, o contrato de promessa de compra e venda foi firmado e integralmente adimplido muito antes do decreto de indisponibilidade judicial, tendo o autor direito a adjudicação compulsória do bem imóvel, com a baixa da restrição na matrícula da unidade imobiliária. (...) 8. Recursos conhecidos e providos".

Na via Extrajudicial temos que o instituto da Adjudicação Compulsória - ferramenta nova, oriunda da Lei 14.382/2022 que a introduziu na Lei de Registros Públicos - Lei 6.015/73 em seu artigo 216-B - tem a mesma finalidade, buscando o REGISTRO em nome de quem comprou, quitou e não teve - não por sua culpa - o título necessário para a inscrição no RGI: a Escritura Pública. Para o êxito do procedimento, como também já falamos em outras passagens, será necessário demonstrar dentro do procedimento (que em alguns Estados ainda não possui regulamentação, infelizmente) os requisitos primordiais que são: a existência do contrato preliminar onde não haja previsão de cláusula de arrependimento, a quitação do preço e a omissão na outorga da Escritura definitiva. Tudo deve ser feito através de Advogado, como exige o referido art. 216-B, mas sem necessidade de um Processo Judicial.

No Rio de Janeiro a regulamentação trazida pelo Novo Código de Normas Extrajudiciais vigente a partir de 2023 é expressa no par. 1º do seu art. 1.269 já abraçando o entendimento jurisprudencial, com muito acerto:

"§ 1º. A existência de ordem de indisponibilidade contra o proprietário tabular não impede o deferimento da adjudicação, mas o seu registro fica condicionado a que antes seja feito o seu cancelamento, salvo se a quitação ou o registro da promessa forem ANTERIORES à inscrição da indisponibilidade.
§ 2º. A requerimento do interessado é possível a expedição de certidão de decisão de deferimento para providências complementares, preparatórias e necessárias ao registro na matrícula do imóvel".

PORTANTO, nessa ordem de ideias entendemos ser possível não só a realização do procedimento mas especialmente a postulação para a baixa da restrição imobiliária junto ao Juízo respectivo que determinou a ordem de indisponibilidade, como se viu.