MUITO SE FALA em pagamento de IPTU como uma válida orientação para robustecer o conjunto probatório destinado a comprovar o "animus domini", base imprescindível para ação de Usucapião. Efetivamente não deixa de ser uma valiosa orientação (inclusive quando os mesmos se encontram em atraso junto à municipalidade), como já explicamos em outras passagens especialmente se considerarmos que a PROVA na Usucapião é um aspecto indispensável e importantíssimo. A bem da verdade, pagar o IPTU pode demonstrar o cuidado e zelo do ocupante para manter o bem ocupado já que o seu não pagamento pode gerar EXECUÇÕES FISCAIS que podem, ao final, desaguar na perda do bem nos termos da Lei 6.830/80. Como também já esclarecemos em outras passagens, o IPTU pode ser cobrado não só do proprietário registral mas também de quem estiver na posse do bem (como por exemplo o posseiro que planeja futura ação de usucapião), nos termos do art. 34 do CTN c/c Súmula 399 do STJ. O referido artigo do CTN reza:
"Art. 34. Contribuinte do impôsto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu POSSUIDOR a qualquer título".
Por tais razões resta claro que pagar o IPTU do imóvel (e mesmo parcelar eventuais débitos) é uma medida salutar para quem pretende Usucapião de bem imóvel - mesmo que o IPTU esteja em nome de terceiros ou do antigo proprietário - todavia a prática demonstra que em alguns casos o proprietário registral (titular do imóvel, que tem o RGI do bem em seu nome) pode continuar pagando o IPTU enquanto o ocupante/posseiro não tem essa diligência. Em tais casos, o só fato do pagamento do IPTU pelo titular registral do imóvel terá o condão de impedir a aquisição do imóvel pelo posseiro (e doutro lado, a consequente perda do imóvel pelo proprietário) através do fenômeno da USUCAPIÃO?
Recordando o que muito falamos aqui sobre o fenômeno da Usucapião, trata-se de um instituto legítimo reconhecido pela legislação brasileira que tem como fundamento a aquisição de imóveis em decorrência do preenchimento de certos requisitos reclamados pela Lei. Fundamentalmente há identidade em todas as espécies de Usucapião admitidas no Brasil no que diz respeito a três requisitos basilares: POSSE (que deve ser qualificada pelo ânimo de dono já que não é qualquer posse que presta para usucapião), COISA (que deve ser coisa hábil para sujeição aos efeitos da usucapião, já que algumas coisas/bens são imunes à usucapião) e o TEMPO (já que o exercício da posse qualificada deve se dar por determinado espaço de tempo, que atualmente vai variar de 2 a 15 anos, conforme a espécie pretendida).
Uma espécie muito usual de Usucapião é a chamada Usucapião Especial Urbana que tem base no art. 1.240 do Código Civil (mas também no art. 9º do Estatuto da Cidade e no art. 183 da Carta Magna) que tem como singularidade a exigência do curto prazo de posse qualificada de apenas CINCO ANOS. Outros requisitos são exigidos para essa espécie de Usucapião que tem prazo curto (que só não é menor que o prazo de dois anos exigido para a Usucapião Familiar do art. 1.240-A). Determina o citado artigo 1.240:
"Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".
Na hipótese - não só da Usucapião Especial Urbana, mas também nas demais espécies - uma vez preenchidos todos os seus requisitos legais - e cabe aqui gizar que em nenhuma delas o PAGAMENTO DE IPTU É REQUISITO - outro caminho não deverá restar ao Magistrado (ou ao Registrador Imobiliário, caso se trate de USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL que nos termos do art. 216-A da Lei de Registros Públicos dispensa processo judicial) reconhecer a aquisição (e a perda, como se disse acima) do imóvel pelo instituto da Usucapião em favor do Requerente. Em outras palavras, se o não pagamento do IPTU pelo possuidor não representa óbice para a aquisição do imóvel por Usucapião, o pagamento do IPTU pelo proprietário registral não terá o condão de garantir que o mesmo não perca seu imóvel para quem provar que preenche os requisitos exigidos em Lei para a aquisição via USUCAPIÃO. Portanto, nossa orientação também de cuidar e zelar pelo seu imóvel a fim de evitar qualquer pretensão de usucapião faz também muito sentido. Outro não é o entendimento dos tribunais, como exemplifica a recente jurisprudência mineira assinada pelo ilustre Professor e Desembargador, Dr. MARCELO RODRIGUES:
"TJMG. 5001560-37.2016.8.13.0245. J. em: 24/01/2024. Apelação cível - USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO - Princípio da dialeticidade - Artigo 1.238 do Código Civil - Posse - Área remanescente de partilha - Ânimo de dono - Lapso legal - Prova testemunhal - PAGAMENTO DO IPTU PELOS PROPRIETÁRIOS - IRRELEVÂNCIA - Ausência de oposição à posse - Confinante - Confirmação dos fatos - Procedência - Recurso ao qual se nega provimento. 1 - Desde que impugnados, de maneira específica, os fundamentos da sentença, bem como apresentadas as razões do seu inconformismo, não há espaço para se falar em ausência de dialeticidade recursal. 2 - O PAGAMENTO DE IPTU PELOS PROPRIETÁRIOS DO IMÓVEL NÃO É APTO, POR SI SÓ, A DEMONSTRAR A POSSE DO IMÓVEL E OBSTAR A PRETENSÃO DE USUCAPIÃO. 3 - Dado que não houve oposição à pretensão por qualquer confrontante, e que o depoimento de um dos confinantes do imóvel confirma o lapso temporal de exercício da posse pelo autor, com ânimo de dono, aliado às demais provas dos autos, dever ser declarada a prescrição aquisitiva".