Estamos sempre falando aqui do art. 1.829 do Código Civil pois, pelo menos em termos de DIREITO DAS SUCESSÕES, esse é um dos mais polêmicos e importantes artigos, já que ele trata da ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. Pelas suas regras e as que seguem, podemos ver - nem sempre com a clareza esperada - QUEM receberá e QUANTO da herança deixada pelo (a) falecido (a).
Uma regra geral que aprendemos no estudo das sucessões é a de que "onde há meação não deverá haver herança" (e isso vira e mexe é representado pela dúvida se o (a) viúvo (a) recebe 50% ou 75% (???) no Inventário). A melhor interpretação - da qual nos filiamos, inclusive - é a de que, sem prejuízo do exame do REGIME DE BENS que deve ser feito e será necessário considerar principalmente no caso do inciso I do art. 1.829, poderá sim haver no mesmo caso de Inventário, em favor do cônjuge sobrevivente MEAÇÃO e HERANÇA mas não sobre os mesmos bens (ou seja, meação sobre os BENS COMUNS e herança sobre os BENS PARTICULARES).
Não devemos perder de vista que MEAÇÃO é instituto que deriva do Direito das Famílias, sendo compreendido à luz do REGIME DE BENS escolhido por ocasião do Casamento (OU DA UNIÃO ESTÁVEL!) e que não tem ultratividade face ao falecimento de um dos cônjuges; já HERANÇA é instituto do Direito das Sucessões e deflui das regras do direito sucessório, principalmente das ora retratadas regras do art. 1.829 (se aplicável ao caso concreto, já que se o falecimento se deu sob o império do CC/1916 as regras que repousarão sobre o caso serão as do Código revogado).
A excelente doutrina dos Desembargadores Aposentados do TJSP, hoje Advogados, Drs. EUCLIDES DE OLIVEIRA e SEBASTIÃO AMORIM (Inventário e Partilha - Teoria e Prática. 2020) leciona:
"Por critério de adequação ao SISTEMA JURÍDICO SUCESSÓRIO, partindo-se do pressuposto de que o direito à COMUNHÃO dos bens exclui a PARTICIPAÇÃO na herança sobre os MESMOS BENS, cabe interpretar que, na hipótese de casamento sob o regime da comunhão parcial, o cônjuge fixa excluído da herança se não houver bens particulares do de cujus, por se tratar de situação análoga à do regime da comunhão universal de bens. Havendo, no entanto, BENS PARTICULARES, o cônjuge viúvo passa a concorrer com os descendentes em quota sobre aqueles bens (e não sobre a TOTALIDADE da herança, como poderia parecer da confusa redação do artigo em comento)".
Como já falamos aqui em outras passagens, bens como HERANÇA recebida por um dos cônjuge pode não entrar na MEAÇÃO daquele casal, porém, em determinada situação pode virar HERANÇA em favor do seu ex-cônjuge - já que são também bens particulares. A Jurisprudência Paulista informa com acerto:
"TJSP. 2228514-47.2020.8.26.0000. J. em: 19/10/2020. HABILITAÇÃO – Inventário – Insurgência contra o INDEFERIMENTO de habilitação da cônjuge do filho herdeiro da autora da herança – Admissibilidade – Casamento sob o regime de COMUNHÃO PARCIAL que prevê a inviabilidade de comunicação de bens recebidos por herança, nos termos do art. art. 1.659, I, CC – Falecimento do cônjuge da requerente que ocorreu após a morte de sua genitora, de modo que o DIREITO À HERANÇA ingressa na esfera de seus BENS PARTICULARES – Incidência do art. 1.829, I, do Código Civil, segundo o qual o cônjuge supérstite CONCORRE com descendentes na partilha de BENS PARTICULARES – Institutos jurídicos de MEAÇÃO e de HERANÇA que não se confundem e cujas respectivas partilhas ocorrem em momentos distintos – Recurso provido".
